19 de fevereiro de 2016

Islamização da Europa: fantasia ou realidade?

Os esforços dos políticos europeus de regularização da crise migratória continuam questionáveis, enquanto movimentos anti-imigração ganham força.

A enorme onda de refugiados e imigrantes que tem chegado à Europa nos últimos meses, provenientes da Síria, do Afeganistão, do Iraque e de outros países muçulmanos, está produzindo fricções e descontentamento nas populações dos países do Velho Continente, não obstante a política oficial de tolerância e multiculturalismo presente em quase todas as democracias da UE, com excepção talvez da chamada Nova Europa, os países de Leste. 
Espaço Schengen, bandeira da União Europeia
© FLICKR.COM/ OONA RAISANEN
Milhares de pessoas vindas do Oriente Médio e de África chegam diariamente às costas de Itália e da Grécia. Estima-se que em 2015 tenham chegado ilegalmente à Alemanha mais de um milhão de pessoas. Parte deles são refugiados, outra parte são imigrantes económicos e, conforme é regularmente indicado na mídia, não é de excluir que entre eles tenham vindo também algumas centenas de terroristas. De referir, neste contexto, que uma percentagem importante das pessoas que chegam à Europa são provenientes dos países que foram alvo de intervenções militares por parte dos EUA e seus aliados.
Em muitos países, os partidos anti-imigração estão ganhando força, seja a Frente Popular na França, o Partido da Liberdade na Áustria (que nas últimas eleições locais obteve mais de 30% dos votos), o Partido Popular na Dinamarca (segundo lugar nas eleições gerais), o partido Verdadeiros Finlandeses na Finlândia, o AfD na Alemanha, sem falar na Aurora Dourada na Grécia, na Liga do Norte na Itália ou do Partido Suíço Popular (SVP), entre outros. 
Na Alemanha, o movimento anti-Islão Pegida organizou no passado dia seis manifestações em várias cidades europeias como Amesterdão, Praga, Calais, Varsóvia e Birmingham. Calais, onde se concentram cerca de 5.000 imigrantes para tentarem passar ilegalmente para o Reino Unido através do Túnel da Mancha, foi a cidade que registrou mais participantes do protesto anti-Islão.
Após as primeiras manifestações em Dresden que reuniram milhares de pessoas, o Pegida apela ao fim do que chama a “islamização da sociedade”. Paralelamente a isso, há nos países europeus também movimentos de sinal contrário, que se mostram dispostos a acolher os refugiados e a observar valores como a compaixão e a tolerância para com todos os que chegam à Europa, venham de onde vierem. 
Mas o tema não é apenas motivo de manifestações de rua, é também alvo de discussão inflamada na mídia, por exemplo em França, e ainda tema para obras de investigadores e cientistas políticos. 
Refira-se apenas um deles, Alexandre del Valle, cientista político e jornalista franco-italiano, especializado em radicalismo islâmico, terrorismo e nas relações Ocidente-Rússia. Ele é pesquisador associado no Instituto Choiseul, sendo colaborador em várias mídias como o Atlantico, France Soir ou Politique Internationale.
Um dos seus primeiros livros tem um título sugestivo: “O Islamismo e os Estados Unidos: Uma Aliança contra a Europa”, no qual ele abordou a forma como os serviços secretos dos EUA utilizaram os Mujahedeen afegãos na sua luta contra a União Soviética.
A sua segunda obra, de 2002, intitula-se “O Totalitarismo Islâmico ao Assalto às Democracias”.
O livro seguinte, de 2009, chama-se simplesmente “A Islamização da Europa”. 
O autor publicou ainda outras obras, nomeadamente o livro “O Islão Radical é uma Arma de Destruição Massiva” (2013).
“Há dez anos, o perigo de a Europa se tornar, dentro de uma ou duas gerações, maioritariamente islâmica era uma fantasia. Hoje em dia, é uma perspectiva bastante realista (embora não certa), porque a Europa renunciou aos seus valores judaico-cristãos e está dominada, por uma cultura de culpa e de morte, por um suicídio civilizacional colectivo (…) A nova realidade da islamização demográfica, cultural e psicológica está a constituir-se em toda a Europa, com 'provas de força', provocações ou escândalos provocados pelas organizações islâmicas subversivas, sob pretextos como o véu islâmico, a Burqa, as caricaturas de Maomé ou os minaretes na Suíça. Através destes escândalos mediáticos — aliás muito bem preparados —, as organizações islâmicas pretendem instaurar um clima de terrorismo psicológico e exercer pressão sobre os governos europeus e sobre uma opinião pública culpabilizada”, escreve o autor no livro “A Islamização da Europa”.
Curiosamente, Alexandre del Valle defende a ideia de aproximação entre Rússia e Europa para criar um novo bloco geopolítico, necessário para combater a ameaça islamista.
O autor disse há dois anos (ou seja, ainda antes da crise dos refugiados) em uma entrevista ao jornal francês Le Figaro:
“Os estrategistas da OTAN, tal como nossos líderes intelectuais e adeptos de uma concepção desenraizada do Ocidente, vêem na Rússia de Putin a última nação europeia que se atreve a desafiar o que eu chamo de "cosmopoliticamente correto". Eu sempre lamentei o fato de que a Rússia ainda é retratada como um perigo. Certamente, ele está longe de ser impecável, mas muitas vezes esquecemos que Vladimir Putin começou sua carreira política com o "clã pró-ocidental-liberal" de São Petersburgo, sob a proteção do ex-prefeito de São Petersburgo Anatoly Sobchak, e ele só se tornou hostil para com o Ocidente a partir de 2004, em resposta à guerra do Iraque, voltada contra o aliado de Moscou e, especialmente, após as "revoluções coloridas" apoiadas pelo Ocidente na Geórgia e na Ucrânia para desestabilizar a vizinhança da Rússia”, disse ele na referida entrevista.  
Em Portugal
Em Portugal a islamização (ainda) não é um problema. Com uma tradição antiga de emigração e de integração de imigrantes, os portugueses não se preocupam muito com o tema. No entanto, a decisão do governo de acolher parte dos refugiados do Oriente Médio de acordo com as cotas propostas por Angela Merkel, tem levado a algumas discussões na mídia e a uma maior visibilidade do Partido Nacional Renovador (PNR), até agora “marginalizado” pela intelectualidade e pela mídia. Considerado como tendo pouquíssima expressão na sociedade, a verdade é que o seu apoio praticamente duplicou nos últimos anos. 
Militantes do Daesh (Estado Islâmico) em comboio rumo ao Iraque
© AP PHOTO/ MILITANT WEBSITE VIA AP, FILE
Se nas eleições legislativas de 2011 havia obtido 17.742 votos, nas eleições de outubro passado já alcançou 27.269 votos.
Esta força política tem realizado diversas manifestações na capital. A última decorreu no passado sábado (13), no centro de Lisboa.  
Cerca de uma centena de pessoas manifestou-se na Praça do Martim Moniz.
“Mais uma vez, queremos alertar os portugueses para o perigo da invasão islâmica do velho continente, que também afetará Portugal, e também alertar para as injustiças cometidas ao dar-se aos invasores aquilo que é negado aos nossos”, indica um comunicado do partido.
"As violações, os desacatos, as agressões, intimidações, o Islão está a invadir a Europa, mas os primeiros culpados nem são os invasores, eles estão no papel deles, os primeiros culpados são os nossos governantes, que não só estão a permitir esta invasão, como estão a incentivá-la (…) É um protesto contra a islamização da Europa, que representa um perigo gravíssimo e que muitas pessoas ainda não estão a perceber", afirmou o líder do partido, em declarações aos jornalistas.
A pouca representatividade deste partido muito provavelmente não lhe dará influência na sociedade, mesmo a médio prazo. Mas não deixa de chamar a atenção para um problema que, sem qualquer dúvida, terá que ser muito bem refletido pelos países europeus.  
                                                 fonte

Sem comentários: