40 anos de vigência da actual Constituição
A Constituição de Abril não encontra a sua génese numa épica tomada do poder, num glorioso movimento popular ou numa memorável revolução. Resulta, apenas, de uma reivindicação salarial, à qual se sucede um golpe de Estado, protagonizado por um grupúsculo de capitães e consentido, em larga medida, por um regime político datado.
Mais grave, porém, é a circunstância de os princípios estruturantes dessa Constituição, concretamente os relativos à organização político-administrativa nacional, terem origem numa vontade militar nunca legitimada democraticamente, nem por via eleitoral, nem por mecanismo referendário.
Inicialmente, porque o poder militar emergente afasta qualquer solução política que implique uma votação popular, quer da estrutura constitucional provisória entretanto adoptada, quer dos respectivos titulares. Depois, porque vincula a Assembleia Constituinte eleita às incontornáveis exigências das designadas Plataformas de Acordo Constitucional, por ele impostas aos partidos políticos sob chantagem política, dado que da aceitação das mesmas faz depender a realização de eleições. Finalmente, porque a Constituição determinada pelo poder castrense não é objecto de referendo popular, perdendo-se, assim, a última oportunidade de mitigar o seu défice democrático original.
A Constituição de Abril, numa óptica substantiva, não emerge como a Lei Fundamental do Povo português globalmente considerado, mas como a Lei Fundamental do Povo de esquerda. Como a Constituição de uma parte dos portugueses, provavelmente já minoritária ao tempo da sua conclusão e decretação, contra todos os remanescentes portugueses.
L. BARBOSA RODRIGUES
Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Professor Associado das Faculdades de Direito das Universidades Lusíada de Lisboa e do Porto
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