A democracia cristã é uma ideologia política que procura
incorporar os ensinamentos cristãos no regime democrático, tendo
surgido em reacção, por um lado, ao liberalismo e ao capitalismo
desregrado, e por outro, aos movimentos sociais e políticos
originados pelo marxismo.
A sua emergência dá-se essencialmente
pela acção do Papa Leão XIII, que, retornando aos ensinamentos de
São Tomás de Aquino, consegue, através de várias encíclicas,
começando pela Aeterni Patris (1879), segundo Prélot e Lescuyer,
“dar ao pensamento católico bases críticas e construtivas.”
Particular destaque deve ser dado à encíclica Rerum
Novarum (1891), que trata das periclitantes condições de vida das
classes operárias no fim do século XIX, e na qual o Vaticano revela a
sua preocupação com a necessidade de melhorar as condições sociais
da maioria destas classes.
Desta forma, a Santa Sé apoia os direitos
dos trabalhadores a formar sindicatos, rejeita o comunismo e o
capitalismo desregrado, mas defende o direito de propriedade
privada e reafirma o papel do estado enquanto promotor do bem
comum.
Em reacção à acção de Leão XIII surgiram vários partidos
políticos, o que não era o seu intuito, já que encarava a democracia
cristã como uma forma de designar obras sociais, ou seja, de cariz
assistencialista. Em resposta, surge a encíclica Graves
de Comunni (1901), que retira a concepção política à
democracia cristã até ao fim da II Guerra Mundial.
Embora o pensamento democrata cristão não deixasse de se
desenvolver, só após a II Guerra Mundial é que a democracia cristã se
consolida politicamente com a origem de partidos políticos que a
assumem como estando na base do seu pensamento e da sua acção
política, superando então a predominância das concepções social e
sindical na democracia cristã.
Sendo partidos interclassistas, têm como princípio primeiro a
dignidade humana, procurando através da prática política criar
condições para a realização em pleno desta, o que tem por base a
doutrina do personalismo, que consiste, segundo Maurice
Nédoncelle, “em reclamar o respeito pela pessoa humana na acção
moral e na organização da sociedade”.
Embora possa assumir diversas concepções filosóficas, o personalismo opõe-se ao
individualismo liberal, procurando enfatizar a pertença do indivíduo
a um povo, uma nação, uma comunidade, para os quais contribui
através de uma miríade de instituições, associações e comunidades,
que são nada mais nada menos que corpos intermédios que numa
democracia pluralista procuram realizar o bem comum.
Partilhando com o conservadorismo posições
morais e sociais, e com o liberalismo a defesa dos
direitos humanos, da propriedade privada e da liberdade
individual, de forma a conseguir conjugar e harmonizar as
diversas unidades e instituições sociais, a responder
às suas reivindicações políticas e a melhorar as
condições de vida das diversas classes, a
democracia cristã preconiza também o
princípio da subsidiariedade,
ou seja, a descentralização política que confere autonomia a diversos órgãos
territoriais e intermédios para tomar determinadas decisões
políticas, e realiza a defesa de uma economia social de mercado,
através da qual procura temperar os excessos do capitalismo e
colocar a produção e desenvolvimento económicos ao serviço da
humanidade e das preocupações de cariz social.
Embora a democracia cristã se confunda em larga medida com a
Doutrina Social da Igreja, na realidade existem partidos democratas
cristãos em que coexistem ramos católicos e protestantes, e partidos
que têm apenas por matriz as Igrejas protestantes.
Ao nível do pensamento político, para além das diversas encíclicas papais, é
ainda de salientar que vários foram os autores que desenvolveram a
democracia cristã, com particular destaque para Emmanuel Mounier
e Jacques Maritain, expoentes máximos do personalismo.
O conservadorismo é encarado geralmente como sendo uma
disposição, uma atitude, com um conteúdo ideológico variável no
tempo e no espaço, embora possa distinguir-se um corpo teórico
concreto que o fundamenta, habitualmente partindo-se de uma
perspectiva anglo-saxónica, que possui em larga medida elementos
que também estão na base do liberalismo.
Não é por acaso que se considera Edmund Burke como o pai do conservadorismo moderno–embora não seja despiciendo referir as contribuições de Richard
Hooker ou David Hume.
Burke foi uma figura de proa dos Old Whigs,
facção de carácter evolucionista e anti-construtivista que se viria a
assumir no seio do partido político que tomava o nome Whig contra
outra que tinha adeptos da acepção liberal continental.
O liberal do séc. XX Friedrich Hayek tem em Burke uma das suas principais
inspirações, e Adam Smith, um dos fundadores do liberalismo,
contemporâneo e amigo de Burke, chegou a dizer que este era “o
único homem que conheci que pensa sobre assuntos económicos
exactamente como eu penso, sem qualquer comunicação prévia
entre nós”.
Enquanto os Iluministas escoceses como Smith e Hume iam
desenvolvendo a doutrina Whig, coube a Edmund Burke não só
elaborá-la, mas também institucionalizá-la e demonstrá-la
com aplicações práticas, na qualidade de Member of
Parliament, por exemplo, defendendo a emancipação
das colónias americanas e criticando violentamente
a Revolução Francesa e os ideais que lhe estavam
subjacentes, em particular o espírito cartesiano e
rousseauniano que determinava a liberdade em
conformidade com a Razão. As suas Reflexões Sobre a Revolução em
França são um dos marcos fundadores do conservadorismo.
Alicerçando-se no pessimismo antropológico e encarando os
indivíduos como produtos sociais e culturais cuja
racionalidade tem limites e é altamente falível, o
conservadorismo rejeita o racionalismo cartesiano
e perspectiva as instituições sociais como o
produto de um complexo processo histórico
caracterizado pela experimentação, dando relevo
às práticas, tradições e instituições que resistem
à provação do tempo.
Para os conservadores, as
condições para que uma sociedade floresça
consubstanciam-se no necessário respeito pelas
forças que mantêm a ordem social, que não deve
ser alvo de manipulação e controlo por parte de
teorias que pretendam acabar com ela. Tal como os
liberais, defendem o mercado livre e opõem-se à manipulação
por parte do governo dos processos do mercado, dado que violam as
regras e princípios do comércio livre, sendo, por isso, uma
intervenção arbitrária corrosiva da liberdade e da justiça.
Conforme assinala José Adelino Maltez, “em termos políticos
tanto há uma ideologia conservadora, marcada pela crença no
individualismo e num Estado mínimo, pela defesa do status quo e da
moral tradicional, por vezes dita conservatismo (do inglês
conservative) como uma perspectiva conservacionista, a ideia
ecologista que visa gerir os recursos naturais numa perspectiva de
longo prazo, de maneira que as gerações actuais não destruam os
benefícios que deles poderão retirar as gerações futuras.”
Chandran Kukathas elabora uma distinção particularmente
útil entre conservadorismo abstracto e substantivo.
O primeiro, no qual se insere Michael Oakeshott, defende que se conserve um
modo de interacção humana que Oakeshott designa por civil
association, uma associação na qual, segundo John Gray, os
indivíduos vivem juntos não sob qualquer fim comum ou hierarquia
de fins, mas pela aderência a um corpo de regras não instrumentais
que lhes permite coexistir em paz; o segundo, de que Roger Scruton
é talvez o melhor representante,
é um tipo de conservadorismo que pretende manter uma determinada e concreta ordem civil, na qual o
indivíduo foi socializado e onde pode cumprir-se e realizar-se em
pleno.
A rejeição do racionalismo em política talvez seja a marca
mais distintiva do conservadorismo contemporâneo, para a qual
muito contribuiu Oakeshott. Para este, o exercício intelectual liberal
de tentar fixar o âmbito e os limites da autoridade do governo é um
exemplo da aplicação do racionalismo em política, que torna o
liberalismo uma mera ideologia, dado que racionalizar partindo
primeiramente de princípios ideais não pode nunca ser definitivo,
tendo os limites do poder que ser circunstanciais e o discurso político
uma razão mais prática do que teórica, de forma a evitarmos incorrer
naquilo que considera a política dogmática e ideológica, em que um
qualquer livro serve para um político desprovido de educação para o
exercício do poder, intelecto e subtileza para entender a política
como uma conversação, actuar de acordo com princípios
doutrinários que se lhe afiguram quase redentores.
Contudo, como Gray salienta, os conservadores na tradição britânica como
Oakeshott, Hume, Burke, Disraeli, Salisbury, Churchill e Thatcher,
vêem a política e o governo não como um projecto de melhoramento
da vida humana (como o socialismo) ou de reconstituição de
instituições humanas ideais perdidas ou esquecidas, mas como um
paliativo dos males naturais e inevitáveis da vida, não devendo
incrementá-los, partindo da concepção da imperfeição humana
assente no circunstancialismo das nossas vidas e da História.
Para finalizar, nada melhor que citar Oakeshott: “Assim, ser
conservador é preferir o familiar ao desconhecido, preferir o tentado
ao não tentado, o facto ao mistério, o real ao possível, o limitado ao
ilimitado, o próximo ao distante, o suficiente ao superabundante, o
conveniente ao perfeito, a felicidade presente à utópica.”
O liberalismo é uma tradição política que representou uma
ruptura com o que se designa por Ancien Régime, materializada
concretamente nas Revoluções Atlânticas – Inglesa (1688),
Americana (1776) e Francesa (1789). Estas encontram-se na origem
daquilo que hoje denominamos por democracia liberal.
Na verdade,a democracia liberal e os diversos entendimentos quanto a esta
podem dividir-se em duas grandes correntes, tendo como diferença
essencial a forma como encaram o conceito de liberdade.
Esta distinção permite-nos considerar que não há apenas um liberalismo,
mas vários, embora o liberalismo constitua uma única tradição
política.
De um lado, os teóricos que inspiraram os revolucionários
britânicos e norte-americanos, em especial John Locke e
Montesquieu, respectivamente, convergem quanto ao cepticismo
em relação ao exercício do poder, apesar de encararem o governo
como um mal necessário, pelo que desenvolvem a teoria da
separação dos poderes, preocupando-se essencialmente em
arquitectar checks and balances que actuem no sentido de
fragmentar e difundir o poder, assim salvaguardando a liberdade
individual da coerção por parte de terceiros, em especial
do próprio estado. Por outro lado, os revolucionários
franceses, em particular os jacobinos, inspirando-se em
Jean-Jacques Rousseau e nas noções de bem comum
e vontade geral, preferiram subscrever a ideia de soberania
popular, em claro contraste com a ideia de governo
limitado que é a base da tradição anglo-americana.
A estas duas concepções corresponde o que se pode
denominar por liberalismo velho e liberalismo novo, ou liberalismo
clássico e liberalismo contemporâneo, respectivamente.
Tendo a liberdade individual como pilar central do
seu corpo teórico, o liberalismo clássico – que é o que
mais importa à Juventude Popular – assenta nos
ensinamentos de Locke, Montesquieu, Adam Smith,
Alexis de Tocqueville e, no século XX, em teóricos
como Friedrich Hayek, Karl Popper, Isaiah Berlin,
Raymon Aron, Betrand Russell entre outros.
Para os liberais clássicos, a liberdade individual é
entendida numa concepção negativa, i.e., como
ausência de coerção por terceiros, o que pressupõe a
existência de propriedade privada protegida pelo
Estado de Direito, que em conjunto com a ênfase nas
liberdades de pensamento e associação e na virtude
da tolerância dão corpo ao conceito de sociedade
civil, ou seja, segundo John Gray, “a sociedade de
homens livres, iguais perante o Estado de Direito,
unidos por nenhum propósito comum para além da
partilha do respeito pelos direitos uns dos outros”.
Os homens livres são, para os liberais, detentores
de direitos naturais, pré-políticos, reconhecem os
limites da razão humana e encaram a sociedade como o resultado de
um complexo processo histórico caracterizado pela interacção de
várias mentes numa matriz de valores, crenças e tradições,
produzindo ordem social através de instituições, hábitos, costumes,
lei e forças sociais impessoais.
Desta forma, o mercado livre é perspectivado como o sistema económico mais adequado para
garantir a liberdade individual, não só porque assenta na propriedade
privada, mas também porque permite a livre iniciativa e associação.
Por último, a actividade política é encarada como um
instrumento que visa criar um enquadramento e condições de
liberdade para que os fins privados de cada indivíduo possam ser
alcançados na sociedade civil.
O governo é um mal que os indivíduos têm de suportar para assegurar que isto seja possível, e o pacto que
leva à sua criação – o contrato social – torna os indivíduos em
cidadãos e confere-lhes liberdade e responsabilidade, direitos e
deveres, poderes e constrangimentos. Sendo os indivíduos, em
última análise, os melhores juízes dos seus próprios interesses, as
áreas de actuação do governo têm de ser restritas e o exercício do
poder constrangido, para permitir o maior grau de liberdade possível
a cada cidadão.
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